YOM KIPPUR (5780) – Estudo para 11 de Outubro de 2019 – 12 de Tishrei de 5780

I. O que é o Yom Kippur – O Yom Kippur acontece oito dias depois de Rosh Hashaná e é o dia da expiação, do julgamento divino. O Yom Kippur começa no crepúsculo que inicia o décimo dia do mês hebreu de Tishrei (entre setembro e outubro do calendário gregoriano) e termina até o pôr-do-sol do dia seguinte. É o único dia de jejum determinado pela Bíblia e é um momento reservado para reflectir sobre as próprias más acções e meditar sobre as faltas cometidas. Os judeus, neste dia, devem orar e pedirem perdão pelos pecados cometidos contra D’us; devem também corrigir as más acções realizadas contra os seus semelhantes. Um dos principais preceitos de Yom Kippur, mesmo para os judeus cujo modo de vida é secular, é um dia de intensa oração e um período de jejum que dura 25 horas.

Em Yom Kippur o país pára completamente durante essas 25 horas: todo o comércio e locais de diversão estão fechados, não há transmissões de rádio nem de televisão, não há transportes públicos e as ruas e estradas estão quase desertas de veículos. Não é permitido trabalhar ou usar sapatos ou outros objectos de couro, pois não se pode usar nenhum material para o qual é necessário matar um animal.

O Yom Kippur marca o fim de um processo chamado teshuvá (retorno ao bem, arrependimento). Durante o Yom Kippur, as orações devem ser voltadas ao pedido de perdão do homem para D’us com relação aos pecados e transgressões que cometeu. A Kippur, expiação do pecado, só acontece se pedimos, previamente, perdão a quem ofendemos e magoamos, se não D’us não poderá intervir. Por isso, costuma-se, nos dias anteriores ao Yom Kippur, pedir perdão para todos aqueles que ofendemos. Ao contrário do que muitos pensam, o jejum não faz parte do ritual do perdão, só tem a função de distanciar o homem das necessidades corporais e aproximá-lo das necessidades espirituais. [1]

II. Yom Kipur: o dia em que o Povo Judeu volta para casa
Yom Kipur, o dia do perdão, é o dia mais sagrado no calendário judaico. Trata-se de um dia de jejum, introspecção e autoanálise, durante o qual confessamos nossos pecados e oramos por um ano bom e doce. O poder do Yom Kipur sobre o Povo Judeu sempre foi imenso. Nesse dia, as sinagogas ficam mais cheias do que em qualquer outro dia do ano. A atmosfera que as invade é solene e majestosa: é como se cada judeu tivesse uma audiência particular com D’us. Por um lado, Yom Kipur é um dia de estremecimento, de julgamento, quando nossa vida é escrutinizada pelo Divino. Por outro, como ensina o Talmud, é o dia mais jubiloso do ano – um dia de perdão Divino e proximidade com o Altíssimo.

Yom Kipur, o último dos dez Dias de Arrependimento, que se iniciam em Rosh Hashaná, é o mais auspicioso do ano para os judeus serem perdoados pelos pecados cometidos contra o Todo Poderoso e contra sua própria alma.

Yom Kipur exige muito de nós – física, emocional e espiritualmente. Além de jejuar, passamos praticamente o dia todo orando. Nesse dia, não podemos comer nem beber, usar calçados de couro, banhar-nos, usar loções, cremes ou perfumes nem manter relações conjugais. No Dia do Perdão devemos transcender o mundo físico e suas limitações. Devemos comportar-nos como anjos, mesmo passando o dia admitindo nossas falhas e nossas fraquezas.

Yom Kipur é um dia de lágrimas e de júbilo. Lamentamos nossos erros e celebramos a infinita misericórdia Divina. Essa é umas das ideias mais belas e importantes que o judaísmo ensinou ao mundo: a de que D’us perdoa. Yom Kipur é o dia do perdão supremo.

O Dia do Perdão se inicia com o famoso ritual do Kol Nidrei, a “anulação dos votos”, recitado ao pôr-do-sol, antes das preces noturnas. Essa oração introduz solenemente o dia mais sagrado do ano, dando o tom para Yom Kipur. Sua melodia derrete o coração. À medida que o Chazan a recita, em sua cadência antiga ouvimos a alma judaica ansiando por transcendência. Ao mesmo tempo, sua melodia pungente ecoa dois mil anos de martírio e heroísmo judaicos. Tolstoi a chamou de a melodia que “ecoa a história do grande martírio de uma nação enlutada”. Beethoven chegou perto, em sua composição mais austera: o sexto movimento do Quarteto de Cordas No 14 em Dó Sustenido Menor, Opus 131. A música do Kol Nidrei é pura poesia: transmite pensamentos e sentimentos que não podem ser expressos através de palavras. E, no entanto, suas palavras são muito prosaicas; seu texto chega a ser técnico.

Kol Nidrei significa “todos os votos”. As palavras recitadas não constituem uma reza nem uma súplica, mas uma simples fórmula legal de anulação prévia de quaisquer votos, juramentos ou promessas que possamos vir a fazer a D’us no ano vindouro. Fazer um voto ao Altíssimo e não o cumprir constitui uma transgressão muito séria. Muitos judeus fazem declarações ou se envolvem em comportamentos que são considerados “votos” pela Torá. Por não perceber que, de fato, fizeram um voto e sem atentar para a gravidade do não cumprimento do que prometeram, podem vir a violar esse compromisso. O propósito do Kol Nidrei é tornar nulos e sem efeito, de forma retroativa, quaisquer votos, proibições e promessas feitas entre o homem e D’us. A anulação dos votos é um ritual importante no que toca à Lei Judaica, mas se trata de um mandamento técnico. Por que abre o dia mais sagrado do ano? Por que a música que arrebata o coração? E por que nos emociona e nos instila um respeito que derrete a alma?

A resposta está no mais profundo significado de Kol Nidrei. Seu propósito não é apenas anular votos, proibições e juramentos sobre o que faremos no ano vindouro, mas também sobre quem somos. No decorrer do ano, um judeu pode jurar que verdadeiramente conhece a si próprio: tem certeza de quem é, do que quer e do que não quer. Quando chega Yom Kipur, ele vai à sinagoga e eis que um novo “Eu” emerge, ao menos por um dia. Ao perceber que está diante do Infinito, quando sua alma é acesa pela santidade do dia e transportada ao Alto pela melodia de Kol Nidrei, percebe que, de fato, ele não se conhece.

Repentinamente, o ser humano entende que jurou ser alguém que na verdade não é; prometeu fazer coisas que não são dignas de um judeu; rejeitou e proibiu para si coisas que devia ter abraçado. Em Yom Kipur, o judeu pode ter uma visão do Mundo da Verdade. Ele percebe, ainda que por um único dia, o real significado da vida – que o que sua essência realmente deseja é retornar à sua origem – para fundir-se na unicidade de D’us. Quando um judeu está na sinagoga na véspera de Yom Kipur e ouve a melodia de Kol Nidrei, ele sente emergir uma nova identidade – uma identidade que ele pode ter ocultado, inclusive de si mesmo, durante todos os dias do ano que se finda. Assim sendo, ele proclama: “Nidrana lo nidrei”: “Meus votos não são votos”; “V’essarana lo essarei”: “E minhas proibições não são proibições”; “Ush’vuatana lo shevuot”: “E meus juramentos não são juramentos”.

Kol Nidrei toca o coração de todos os judeus, fazendo-os tremer, pois essa oração liberta sua alma das ilusões de um mundo que desafia e confunde a alma judia e oculta seu Divino Criador. Kol Nidrei é a abertura mais adequada para Yom Kipur – o dia no qual os judeus voltam para seu verdadeiro “Eu” e se recordam, ao menos por um dia, que sua verdadeira identidade é uma alma que arde sedenta da Luz Infinita. Há outra razão para o Kol Nidrei anunciar o dia mais sagrado para os judeus: o fato de seu tema ser o mesmo que o de Yom Kipur – o retorno do judeu a seu verdadeiro lar. Acredita-se que essa oração se tenha originado no século 7, quando os judeus espanhóis, que viviam sob domínio visigodo, estavam sendo forçados a renunciar à sua fé e a se converterem. Muitos deles optaram por publicamente abandonar o judaísmo em vez de enfrentar a tortura e a morte – mas permaneceram judeus em segredo. Em Yom Kipur, Dia do Perdão, eles iam à sinagoga e oravam para ter o seu voto de conversão anulado. Isso explica por que se faz uma declaração imediatamente antes do início da recitação do Kol Nidrei, em que se dá permissão “pela autoridade da Corte Celestial e da Corte Terrestre” para que os “transgressores” unam-se à congregação em oração. Isso era recitado para anular a ordem de excomunhão dos judeus que, durante o ano, tivessem abandonado o judaísmo. Assim sendo, Kol Nidrei é a abertura dos portões da inclusão judaica, que permite que retornem a Casa todos aqueles que se afastaram de D’us, da Torá e do Povo Judeu.

Retornar a Casa – a D’us, à Torá, ao Povo de Israel – é o tema principal do Dia do Perdão. A palavra hebraica Teshuvá, geralmente traduzida como “penitência”, é o que buscamos alcançar em Yom Kipur. Mas, literalmente, a palavra significa “retorno”. Teshuvá não é um simples lamento por nossos erros e pecados, mas uma reconstituição de nossos passos – a volta a Casa. Segundo o judaísmo, o pecado significa “deslocamento” e o “cruzar fronteiras”, cuja consequência é o exílio. Adão e Eva foram exilados do Éden; o Povo Judeu foi exilado de sua Terra. Um pecado é um ato que está fora de lugar, deslocado, e que transgride fronteiras estabelecidas. A característica mais marcante do pecado é o sentir-se perdido, alheio a D’us, não conhecendo seu próprio lugar na Terra e sentindo-se espiritualmente confuso. Teshuvá significa, pois, encontrar seu caminho de volta a Casa. Significa voltar às suas origens, ao lugar onde realmente pertencemos. Em Yom Kipur, as sinagogas ficam repletas de judeus que raramente as frequentam. Durante o ano, ainda que de forma menos dramática do que a de seus antepassados medievais, eles se comportaram como judeus ocultos .

É possível que tenham se esquecido de D’us, de seu judaísmo e de sua identidade judaica; eles podem ter usado máscaras e portado outras identidades. Mas Yom Kipur lhes dá a oportunidade de redescobrir quem de fato são e encontrar seu caminho de volta a Casa. Essa é uma das razões para o Kol Nidrei ser o serviço de abertura do Dia do Perdão. Isso porque nesse dia mais santificado do ano, aqui na Terra proclamamos – e os Céus ecoam nosso clamor – que todos os judeus, mesmo os mais sérios transgressores – mesmo aqueles que se afastaram muito do caminho do judaísmo – são bem vindos de volta a Casa. Após ter feito tal declaração, que nos une como se fôramos um, nossas almas são elevadas pela música do Kol Nidrei, que proclama em nome de cada um de nós: é isto o que verdadeiramente sou e é a este lugar que pertenço: entre meu povo, devotado ao judaísmo e na presença de meu D’us. E se durante o próximo ano, novamente eu me deixar levar pela desatenção e pela dúvida, desde já anulo todos os meus votos, proibições e juramentos que mascarem minha verdadeira identidade e me desviem para o mau caminho. Kol Nidrei nos ensina que Yom Kipur é muito mais do que um dia de jejum e oração, no qual somos perdoados pelos pecados que cometemos contra D’us. É uma oportunidade para o autoconhecimento. Para nós, judeus, Yom Kipur é o dia em que mais sentimos que nosso Pai Celestial, que constantemente anseia por nós, está intimando-nos a voltar a Casa.

Todo judeu é um Cohen Gadol – Em tempos remotos, Yom Kipur consistia de um serviço oficiado pelo Cohen Gadol, o Sumo Sacerdote. No dia mais sagrado do ano, o Cohen Gadol, homem mais santo do Povo de Israel, entrava na câmara mais santificada do Templo Sagrado de Jerusalém, o Kodesh HaKodashim, e expiava os pecados do Povo Judeu. No decorrer de quase toda a Era Bíblica, Yom Kipur consistia de elaborados serviços oficiados ao longo do dia pelo Sumo Sacerdote. Com a queda do Segundo Templo e o exílio subsequente do Povo Judeu, a vida judaica mudou substancialmente e, com ela, os serviços de Yom Kipur. Já não existia um Templo nem um Sumo Sacerdote; tampouco havia sacrifícios e o bode expiatório que serviam para expiar os pecados de Israel. É verdade que o Primeiro Templo tinha sido destruído pelos babilônios seis séculos antes, e que durante 70 anos não houve Templo nem Sumo Sacerdote. Mas quando o Primeiro Templo foi destruído, havia profetas – especialmente Jeremias – que tinham dado esperança ao povo. Jeremias profetizara destruição, mas também o iminente retorno à Terra de Israel, e ele, que fora um verdadeiro profeta, tivera razão nas duas profecias. Mas quando caiu o Segundo Templo, não foi feita profecia alguma de que seria reconstruído em breve.

A derrota da revolta de Bar Kochba confirmou a profundidade da crise. O Povo Judeu novamente entrara no exílio e, dessa vez, não havia garantia de um breve retorno. O que seria do dia mais sagrado do ano judaico? Sem Templo Sagrado e sem Cohen Gadol, quem e o que serviriam de expiação para o Povo Judeu? No meio dessa crise profunda surge o maior Mestre da História Judaica, Rabi Akiva, a quem o Talmud chama de “pai do mundo”. Rabi Akiva ensinou a seus alunos, que, por sua vez, ensinaram ao Povo Judeu que, na ausência do Templo Sagrado e do Sumo Sacerdote, eles poderiam voltar-se diretamente a D’us, e através de uma combinação de Teshuvá, oração e boas ações,conseguir a expiação. Em Yom Kipur, todas as sinagogas serviriam de substituto para o Templo Sagrado e todos os judeus serviriam de Cohen Gadol. Com destruição e exílio, a santidade foi democratizada.

Cada um dos judeus foi convocado a personificar o Sumo Sacerdote. As orações e súplicas proclamadas por todos os judeus serviriam para substituir os sacrifícios e os serviços realizados em Yom Kipur quando o Templo existia. Essa responsabilidade religiosa assumida por cada um dos judeus afetou – e, de fato, transformou – nosso povo de maneira extraordinária.

Durante a Era Bíblica, o Povo Judeu era retratado como um povo infiel e rebelde, que praticava a idolatria e violava os mandamentos da Torá, incorrendo por isso na ira de D’us e de Seus porta-vozes, os profetas. Após a queda do Templo, quando os judeus foram expulsos de sua Pátria, eles se tornaram o povo mais fiel entre todos: a única nação a manter sua identidade religiosa durante dois milênios. Apesar das grandes adversidades, apesar dos incentivos para abandonar o judaísmo e da perseguição e do sofrimento que suportaram, os judeus resistiram à assimilação e se recusaram a se converter a outras religiões. Eles que no passado cometeram idolatria e renegaram a Torá, nesse então preferiam a tortura e a morte a trair D’us e renunciar a seu judaísmo e à identidade judaica. A tenacidade judaica mereceu o respeito de pessoas tão diferentes como Blaise Pascal e Friedrich Nietzsche. Como isso aconteceu? Como o Povo Judeu transformou a tragédia espiritual em triunfo? Aconteceu porque na ausência de um Templo e de um Sumo Sacerdote, a responsabilidade por se comunicar intimamente com D’us e alcançar a expiação recaiu sobre cada um dos judeus. Isso foi transformacional. Como já não havia sacrifícios, bodes expiatórios e Sumos Sacerdotes, os judeus foram compelidos a pessoalmente buscar D’us e expiar por si sós.

Yom Kipur em nossos dias – Na ausência do Templo Sagrado e do Cohen Gadol, em Yom Kipur todas as sinagogas devem ser um Mikdash Me’at – um pequeno Santuário – e todos os judeus devem tomar a si a missão do Cohen Gadol. Na época Bíblica, em Yom Kipur, as pessoas apenas observavam, enquanto o Sumo Sacerdote desempenhava um serviço físico extremamente pesado. Hoje em dia, na ausência do Templo e do Cohen Gadol, não podemos ficar em casa, dormir ou ir à sinagoga e apenas apreciar os serviços religiosos. Nós, também, precisamos realizar um trabalho que exija muito de nós – física, emocional e espiritualmente. Apesar da fome e do cansaço, temos que dar o melhor de nós e orar tanto, tão bem e com tanta sinceridade quanto possível, para obter a expiação e o perdão para o Povo Judeu e para o mundo, em geral.

No Dia do Perdão, cada um de nós, mesmo que não seja Cohen, deve desempenhar a missão do Cohen Gadol, levando em seus ombros o destino e o bem-estar do Povo de Israel. Na realidade, a aceitação de tamanha responsabilidade espiritual é uma das razões para que tantos judeus se vistam de branco em Yom Kipur: por ser uma reminiscência dos trajes brancos do Cohen Gadol, usados antes de adentrar no Kodesh HaKodashim. Durante os Dez Dias de Teshuvá, que se iniciam em Rosh Hashaná e terminam em Yom Kipur, referimo-nos a D’us como Avinu Malkenu – nosso Pai, nosso Rei. Durante esses dias, D’us atua como monarca – que julga seus súditos – e como pai – que perdoa e abraça seus filhos. Em Yom Kipur, que é o auge do período mais sagrado do nosso calendário, cada um dos judeus também assume dois papéis: o de Sumo Sacerdote – um líder espiritual, que destemidamente se aproxima do Rei para defender e interceder por seu povo – e no papel de filho, que volta a casa para visitar seu Pai e seus irmãos.

Os temas centrais de Yom Kipur – o retorno ao lar espiritual e a democratização da santidade – são entrelaçados: o último depende do primeiro. Em Yom Kipur, quando um judeu volta a Casa – a seu Pai Celestial, à sua verdadeira identidade, à sua fé e a seu povo, ele se recorda de quem de fato é e o que deve fazer em sua vida. Quando isso ocorre, percebe que tem responsabilidade moral e liderança espiritual por todos os demais judeus. O tema universal de Yom Kipur é que se o ser humano optar por transcender suas aparentes limitações, não haverá limite para sua ascensão. Rabi Akiva, que, como dissemos acima, foi aquele que democratizou a santidade judaica, só retornou ao judaísmo aos 40 anos de idade. Ele se tornou o maior Mestre do Talmud e o responsável por ter salvado a Torá do esquecimento. Rabi Akiva atingiu um nível espiritual jamais atingido por qualquer Cohen Gadol. Interessante mencionar que o dia de seu martírio, quando sua alma ascendeu ao Altíssimo, é Yom Kipur, o dia mais sagrado do ano.

As lições de Yom Kipur são atemporais: aplicam-se em todos os lugares, em todas as gerações e à vida de qualquer judeu. Que seja a Vontade Divina que o tema de Kol Nidrei reverbere dentro de nossa alma enquanto vivermos nesta Terra, para que nós, judeus, sempre possamos, individual e coletivamente, ser verdadeiros com nós mesmos. E que todos possamos, não apenas em Yom Kipur, mas em todos os dias de nossa vida, esforçar-nos para crescer em todos os aspectos da santidade e da bondade. Pois, como está escrito: “Eles se fortalecerão continuamente; e cada um deles se apresentará perante D’us, em Tsion” (Salmos, 84:8). Amen, Ken Yehi Ratsón. [2]

III. A ciência do jejum de Yom Kipur – Conheça algumas dicas de como encarar as 24 horas de jejum religioso sem ter grandes incômodos ou problemas de saúde.

Por Ruth Schuster – HAARETZ/ Tradução de Marcya Salomão – MENORAH BRASIL
O jejum judaico do Yom Kippur, o Dia da Expiação, é diferente da maioria das outras formas de jejum, porque inclui a abstinência de líquidos. Mas de acordo com a nutricionista Mariana Urbach, uma pessoa saudável pode passar 24 horas em jejum total com relativa facilidade: “Parece longo para nós, mas não para os nossos corpos. Os sadhus da Índia podem jejuar por por meses”. Mas é preciso ter muito cuidado antes e durante o jejum.

A verdade é que os seres humanos evoluíram durante períodos de dificuldades. A atual abundância de alimentos é uma situação muito recente na história, e se não tivéssemos organismos capazes de atravessar grandes períodos de fome, a Humanidade teria se extinguido há milênios. Nossos corpos armazenam energia para tempos difíceis na forma de glicogênio, um polissacarídeo, ou cadeia longa de açúcar, no fígado e nos músculos. Quando nós não comemos, nosso corpo se apoia no glicogênio para continuar mantendo a sua energia, explica Urbach. É graças a estas reservas de energia que podemos passar incólumes pelas 24 horas do jejum de Yom Kippur. Mas renunciar à hidratação, como o judaísmo prescreve para Yom Kippur, é uma outra questão. 24 horas sem líquidos causa um grande estresse fisiológico, o que pode ocasionar danos reais. “Nós não somos camelos”, ressalta a nutricionista. Isso é ainda mais verdadeiro em países quentes como o Brasil, ou secos como Israel. Mas isso não significa que os judeus de países frescos e úmidos também não corram riscos ao jejuar.

A água é o componente mais importante do nosso corpo. E ela não pode ser armazenada como no caso do glicogênio. Podemos viver sem comida por um longo tempo, mas não sem a ingestão de líquidos. Além disso, estamos constantemente perdendo água, de forma imperceptível. Até mesmo pela respiração.

… “A maioria das pessoas vive em um estado perene de desidratação parcial fronteira”, afirma Urbach. “A longo prazo, pagamos um preço por isso. Por exemplo, sob a forma de pedras nos rins. Se começarmos o jejum de Yom Kippur sem estarmos saturados de água, estaremos mais propensos a sofrer de dores de cabeça e até de desidratação severa.” Além disso, como a nossa fisiologia é toda à base de água, quando desidratamos, nossos corpos se tornam estressados e nosso metabolismo fica mais lento. Isso ajuda a explicar, fisiologicamente falando, por que as pessoas não perdem peso durante esse jejum de 24 horas, embora a lógica sugira o contrário.

“Nossos corpos são inteligentes”, explica a nutricionista. “Quando o corpo sente uma deficiência, ele reage de forma inteligente e desliga os sistemas que não são imediatamente necessários, a fim de conservar seus recursos”. Outro efeito é que a temperatura do corpo vai cair. A manutenção de uma temperatura corporal constante é muito cara em termos de recursos. Assim, o corpo estressado pela falta de água vai baixar o “termostato” um pouco. Esta sabedoria se aplica às dietas em geral: Não descuide da água ao tentar perder peso. No entanto, após o jejum de 24 horas, se você subir em uma balança, você certamente constatará uma diminuição no seu peso. Por quê? Porque você perdeu água, mas não gordura. “Para perder um único quilo de peso real, você tem que abrir mão de cerca de 9 mil calorias, o que não acontece em um dia”, observa Urbach.

Como tornar seu jejum mais fácil? Nós podemos ficar sem comida, mas não sem líquido. No entanto, isso é o que exige a observância rigorosa do jejum de Yom Kippur. Mas há formas seguras de passar o período: Comece a preparar o seu corpo uma semana antes de Yom Kippur. Reduza o café e outras bebidas com alto teor de cafeína, como refrigerantes e bebidas “energéticas”. Viciados em cafeína são os que costumam ter as piores reações ao jejum.

Os sintomas incluem dor de cabeça, indisposição geral e náuseas até cerca de 14 horas após o último copo. O chá preto é mais fraco que o café. Mas se você está habituado a consumi-lo em grandes quantidades, corte-o com bastante antecedência também. “Normalmente você toma uma aspirina para a dor de cabeça, mas você não pode fazer isso no dia do Yom Kippur,” Urbach ressalta. “Comece a beber chá verde ou chá de ervas em vez disso.”

… Em segundo lugar, a famosa “Dieta de Atkins”, de baixo consumo de carboidratos e altas quantidades de proteína, é terrível para os judeus que jejuam. Assim como os que aderiram à recente moda da dieta sem glúten (deixando de lado as pessoas com intolerância ao glúten, que não têm uma escolha). “As pessoas que não comem carboidratos e ingerem um montão de proteínas estão produzindo uma grande quantidade de ureia, que o corpo tem que secretar, o que requer uma grande quantidade de água”. Em outras palavras, para se livrar da ureia (que é tóxica), você precisa urinar muito.

O que comer antes e após o jejum? Na manhã anterior ao início do jejum, consuma o máximo possível de carboidratos. Isso ajuda a encher seus depósitos orgânicos de glicogênio. “Você pode começar com um bela torrada de pão integral em seu café da manhã. Mingau e cereais também são bons. Ainda na parte da manhã, faça um lanche com frutas ou um bolo de mel, acompanhado de uma xícara de chá verde.

Para o almoço, massas, arroz ou batata. E durante todo o dia, beba o máximo possível de líquidos, preferencialmente água. Saturar seu corpo com o máximo de água é fundamental. Você sabe que você bebeu o suficiente se sua urina é clara e não tem cheiro, diz a nutricionista Urbach. Então você terá que ir ao banheiro com mais frequência, mas este é o menos incômodo dos efeitos colaterais que você terá.

A última refeição antes do jejum – e isso é o mais importante – deve ser a leve possível. Você passou o dia armazenando glicogênio. Agora não vá estragar tudo distendendo seu estômago por conta de um “pânico pré-jejum”. Um estômago distendido envia sinais de fome mais cedo do que o necessário. …Sobremesa? Nem pensar! Reserve os doces para depois do jejum.

Findo o jejum, resta apenas fome e, principalmente, a sede. Não beba um copo d’água atrás do outro. Isso provoca uma espécie de choque em seu organismo, que vai diluir seu sangue e que não dá tempo para seu corpo se reajustar, diz Urbach. Ingerir muita água em pouco tempo após 24 horas de jejum pode provocar até mesmo desmaios.

Sorva calma e lentamente um copo de água, chá adoçado ou outra bebida leve. Então dê uma mordiscada em alguma coisa. Algumas uvas, uma romã, um pedaço de bolo de mel ou uma maçã assada. E faça uma refeição mais substanciosa cerca de uma hora depois dessa quebra.

Quem não deve jejuar? Se você toma medicamentos controlados ou tem alguma doença crônica, pergunte ao seu médico. O mesmo se aplica às crianças, gestantes e idosos. Lembre-se que o Judaísmo isenta toda e qualquer pessoa com algum problema de saúde de fazer o jejum, portanto não há nenhum pecado em descumprir o mandamento se não houver condições. E é sempre bom consultar seu médico. Tzom kal! Tenha um jejum fácil! [3]

Fontes: [1] Embaixada de Israel em Portugal, 29.09.2017: https://embassies.gov.il/Lisboa/NewsAndEvents/Pages/Yom-Kippur-5778.aspx
[2] Morasha, Edição 81 – Agosto de 2013: http://www.morasha.com.br/yom-kipur/yom-kipur-o-dia-em-que-o-povo-judeu-volta-para-casa.html
[3] Menorah Brasil, set 16, 2015, José Roitberg, Notícias de Israel: https://www.menorahnet.com.br/a-ciencia-do-jejum-de-yom-kipur/
Coordenador: Saul Stuart Gefter 12 de Tishrei de 5780 – 11 de Outubro de 2019

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *