O ABORTO NO JUDAISMO (5780) – Estudo para 07 de fevereiro de 2020 – 12 de Shevat de 5780

O aborto no judaísmo – Não matarás” é o sexto mandamento Divino dos dez que se encontram nas Tábuas da Lei. Isso significa que devemos preservar a vida humana, e não abreviá-la. Assim, o aborto no judaísmo é proibido, uma vez que, para o judaísmo, a vida começa no momento da concepção. Sendo assim, o aborto não é permitido porque infringe essa proibição. O motivo é que consideramos o feto um ser vivo, que possui alma, e por isso evitar um aborto é equivalente a salvar uma vida. O fato de a criança estar ainda na barriga da mãe em nada altera a proibição de tirarem-lhe a vida.

A não ser em casos extremos e raros, como perigo de vida para a mãe ou doenças congênitas gravíssimas, onde uma autoridade rabínica sempre deverá ser consultada, não se permite o aborto em nenhuma instância. O aborto só é permitido no caso de o feto atentar à saúde da mãe e a gestação ser considerada perigosa para ela. Não faz diferença se o perigo é de ordem física ou mental. Neste caso, dá-se preferência à vida da mãe, por ela ser um ser vivo independente.

Matar somente em legítima defesa nos diz a Torá – A base para isso na Torá está na lei chamada de “rodêf” (perseguidor). Por exemplo, se caso alguém esteja em seu encalço para matá-lo. Nesta situação você tem o direito e o dever de se defender e, em nome da legítima defesa, até mesmo matar seu perseguidor. Isso se não houver outra alternativa. Todavia, se a criança já nasceu parcialmente, ou seja, se a testa ou a perna já saiu, não mais é permitido dar prioridade à vida da mãe. Neste caso, o bebê já é considerado um ser vivo independente, tal qual a mãe. No caso de o feto não causar perigo à mãe, o Judaísmo sustenta que o aborto não pode ser feito em hipótese alguma. Isso mesmo que os pais não queiram a criança. Porém, entre os legisladores rabínicos há quem permite o aborto no judaísmo.

Por exemplo, no caso de o feto apresentar problemas congênitos graves que possam acompanhá-lo por toda a vida. Assim como acontece com a doença de Tay-Sachs, ou quando ele, comprovadamente, não viverá por muito tempo, como no caso de anencefalia. Obviamente que em cada caso deverá ser consultada uma autoridade rabínica competente nessa área antes de se tomar qualquer decisão. Tudo isto diz respeito à Halachá, a Lei Judaica.

Para o Zohar, o aborto no judaísmo é um pecado grave – O sagrado livro do Zohar, obra de base do misticismo judaico, considera muito grave qualquer ato feito para cessar uma gravidez. Assim, salvo se for para salvar a vida da mãe, o aborto é permitido, pois a gravidez é uma edificação e uma obra Divina. Qualquer ato feito para interrompê-la estaria indo contra a vontade do Criador. Enfim, o aborto no judaísmo é proibido.

Às vezes, uma alma precisa descer e reencarnar neste mundo, mesmo que para viver por dias ou horas. Vem assim somente para completar e concluir sua missão. Vários sábios cabalistas afirmam que, às vezes, uma alma muito elevada desce a este mundo num corpo imperfeito. Pode vir num corpo em estado de demência, pois um corpo normal não a comportaria. Sem dúvida, os pais ficam aflitos com uma criança que necessita de cuidados especiais por toda a vida. Todavia, certamente eles recebem de D’us forças espirituais adicionais para esta nobre missão. De qualquer forma, devemos manter nossa fé e confiança no Todo-Poderoso. É preciso ter sempre em mente que os caminhos de D’us são insondáveis. Assim como diz o Profeta (Isaías 55:8): “Pois Meus pensamentos não são os seus pensamentos e Meus caminhos não são os seus caminhos”. Na tão almejada época messiânica, entenderemos os mistérios e enigmas da vida. [1]

II. Segundo rabino, tradição judaica defende aborto considerando-se a integridade física da mãe – A Confederação Israelita do Brasil também participou da audiência pública, no Supremo Tribunal Federal (STF), que discute a descriminalização do aborto. O rabino Michel Schlesinger ressaltou que, segundo a tradição judaica, o aborto é permitido e recomendado em diversos estágios da gravidez, considerada a integridade física da mãe. De acordo com ele, as razões que poderiam justificar o aborto, sob a perspectiva judaica, vão do risco de vida da mãe, passando pelo risco de saúde física ou mental da mãe, que inclui casos de estupro, incesto, adultério, gravidez na infância, gravidez na velhice, falta de condições sócio-econômicas, bem como a má formação do feto (anencefalia, doenças graves), entre outros. O expositor afirmou que, conforme o judaísmo, não existe vida completa e autônoma durante a gravidez, mas um potencial de vida, “que é sagrada e precisa ser resguardada, no entanto, permanece em debate com diversos outros valores que o cercam”. [2]

III. O aborto na Lei Judaica, por Rachel Biale – A lei judaica ( halachá) não tem uma posição única e coerente em relação ao aborto. Ela apresenta uma série de opiniões centrais, as quais desenvolvidas até a sua conclusão lógica, levam a uma gama de possíveis decisões legais sobre o aborto e a contradições internas. O aborto aparece na legislação bíblica somente no caso de perda acidental do feto. “Quando dois homens brigam e um deles empurra uma mulher grávida e isto resulta num aborto acidental, mas nenhum outro dano ocorre, o perpetrador será multado em tanto quanto o marido possa conseguir dele ” ( Êxodo 21:22) . O aborto induzido acidentalmente é tratado como uma questão civil e o marido é compensado pela perda da progenia ( uma vez que , segundo a lei bíblica , todos os “produtos ” de sua mulher são se sua propriedade ). Se, no entanto, “outro dano” ocorre, isto é , a mulher é morta ou ferida , “a pena será vida por vida”( ibid ). A destruição de um feto não é considerada um crime capital e, portanto, concluem fontes posteriores, o feto não é considerado uma pessoa viva. Na verdade, o feto é definido como parte do corpo da mãe : “ubar ierech imo”( “o feto é <como> a coxa de sua mãe”, Hulim 58a, Gittin 23b ).

A lei judaica não tem uma posição única e coerente em relação ao aborto. O feto não tem direitos independentes e pode ser destruído para salvar a vida da mãe, até mesmo na hora do parto:
“se a mulher está tendo dificuldade no parto, deve-se cortar o feto dentro dela e retirar parte por parte porque sua vida tem precedência sobre a vida do feto. Uma vez que sua parte maior tenha emergido, não a toque porque não se pode por de lado uma vida pela outra”( mishná Oholot 7:6 ). Portanto, o feto se torna uma pessoa independente somente quando sua cabeça ou a maior parte do seu corpo tenha emergido ( Sanedrim 72b ). De fato, o recém nascido não é considerado completamente viável até 30 dias após o seu nascimento e sua morte antes dos 30 dias não recebe o mesmo processo de luto que as outras mortes.

Entretanto, o feto é valorizado como uma vida em potencial e, assim, é permitido violar outras leis de modo a salvar sua vida, como, por exemplo, carregar uma faca no Shabat para operar e ajudar num parto ( Ioma 85b). Conseqüentemente, até mesmo as autoridades haláchicas que baseiam sua decisão no princípio de que o feto não é uma pessoa permitem o aborto somente nas circunstâncias mais graves. Na verdade , a maior parte das autoridades haláchicas permitem o aborto somente para salvar a vida da mãe . Eles seguem, de um modo ou de outro argumento de Maimônides de que o feto é um perseguidor ( rodef) o qual, como um assassino perseguindo sua vítima , pode ser morto para salvar a vida do perseguido. “Assim, os Sábios estabeleceram que quando a mulher está tendo dificuldade no parto , pode-se desmembrar a criança dentro de seu ventre, tanto por drogas quanto por cirurgia , porque ele é um perseguidor tentando matá-la “( Mishinei Torá, Ilchot Rotzeach u-Shmirat Nefesh 1:9). A decisão de Maimônedes de que o feto é um “perseguidor ” implicitamente solapa o argumento de que o feto não é uma pessoa. Em outras palavras, se a única razão pela qual o feto pode ser destruído é a de que ele é um perseguidor, a implicação é a de que ele pode ser considerado uma pessoa.

Embora Maimônides não tenha chegado explicitamnete a esta conclusão , autoridades posteriores o fizeram. Rabi Raim Soleveitchik utiliza este argumento de um modo muito mais radical que as outras autoridades haláchicas quando afirma que: ‘ A razão para a opinião de Maimônides aqui … é a de que ele acrdeditava que o fweto cai na categoria geral de pikuach nefesh <salvar uma vida>, uma vez que o feto também é considerado uma nefesh e não é posto de lado pela vida dos outros ( Chidushei Rabi Chaim Soloveitchik a Mishnei , Tora.,Ilchot Rotzeach , 1:9) Seja como for, se a pessoa aceita a posição de Maimônides ou a talmúdica em relação ao status do feto, o aborto é permitido – e exigido – para salvar a vida da mãe.

Além de permitir o aborto para salvar a vida da mãe, o Talmud cita outra situação onde o aborto é permitido : “Se uma mulher vai ser executada, não se espera até que ela dê à luz… Deve-se atingi-la no ventre de modo que a criança possa morrer primeiro , evitando que ela fique desgraçada”( Arachin 7a-b). O feto não tem direito independente ( mas) é valorizado como uma vida em potencial. Portanto, a dignidade de uma mulher condenada tem precedência sobre a vida do feto, e também a angústia mental que ela experimentaria se fosse esperar pela execução para completar a gravidez. A implicação desta decisão, na opinião de autoridades legais mais permissivas, é a de que o aborto pode ser ativamente buscado e induzido para salvar a mulher de um grande sofrimento mesmo que este sofrimento seja apenas psicológico . Assim, Jacob Emden, um halachista do século XVIII, permitiu o aborto a uma mulher que havia concebido uma criança através de adultério, por causa de sua “grande necessidade”, quer dizer, sua angústia “só de pensar em dar à luz um manzer < bastardo>” (Sheélat Iaavetz No.43).

Entretanto , diferente de Emden, a maioria dos halachistas- até mesmo os mais “lenientes”- permitem o aborto somente quando há um perigo físico ( e não psicológico ) para a mãe . Bem Zion Uziel,por exemplo, rabino-chefe ashkenazi de Israel nos anos 50, permitiu o aborto no caso onde a mulher grávida ficaria surda se não fizesse o aborto ( Mishpetei Uziel, Oshen Mishpat 3:56). Assim, uma minoria de halachistas segue o axemplo de Emden de permitir o aborto para evitar um dano psicológico à mãe. Dentre os halachistas mais contemporâneos, o Rabi Ichiel Jacob Weinberg da Suíça permitiu o aborto de um feto de uma mulher contaminada com rubéola e o Rabi Eliezer Waldenberg em Israel legislou que um feto com Tai-sachs pode ser abortado.

Nenhum dos dois justificou sua decisão com base no possível sofrimento do bebê, um argumento halachicamente aceito, uma vez que não existe permissão haláchica na eutanásia baseada na “qualidade de vida”. Ao invés disso, eles basearam suas decisões na angústia da mãe lidando com a perspectiva de estar carregando uma criança fatalmente doente ou deformada, porque , como argumenta Walenberg, “o sofrimento psicológico é, muitas vezes, maior que o sofrimento da carne”( Responsa Tzitz Eliezer, Parte 13,No 102). Mesmo que um julgamento ético sem ambigüidade pudesse ser feito contra o aborto, a falta de consenso público e a proibição contra se colocar em risco a vida de uma pessoa levantariam problemas haláchicos significativos.

Em resumo, a halachá afirma claramente que o feto não é uma pessoa, não apenas até o fim do segundo trimestre de gravidez ( N.T.: prazo para a efetuação do aborto legal nos Estados Unidos) mas até o próprio momento do parto. Entretanto, o princípio de proteção a uma vida em potencial e a justificação do aborto com base na idéia de que o feto é um “perseguidor” limitam mesmo as autoridades haláchicas mais lenientes a sancionar o aborto somente em casos de grave ameaça física ou psicológica para a mãe.

Permanece a questão de como a discussão haláchica de aborto se relaciona com as questões constitucionais levantadas por Roe v. Wade ( N.T.: caso cuja resolução jurídica marcou a legalização do aborto nos Estados Unidos). Grande parte da discussão de Roe v. Wade focaliza a questão de se o aborto deveria ser imune da interferência legislativa com base nos direito de privacidade e liberdade individual. A halachá não adere exatamente às categorias constitucionais de privacidade e liberdade individual, mas algumas analogias são evidentes .

Uma das “metaleis ” fundamentais da halachá é : “Não fazemos uma lei ( quezeira) a qual a maioria da comunidade não possa obedecer “( Baba Kama 79b). Na verdade um dos principais argumentos “pragmáticos” a favor do aborto legal tem sido que a maioria das mulheres que buscam o aborto não se deteriam por causa de uma proibição e sim lançariam mão de um aborto ilegal. Tais abortos forçam as mulheres a colocar suas vidas em perigo e colocar uma vida em perigo é proibido pela halachá. Deve-se violar qualquer mandamento para salvar a vida de uma pessoa, à exceção das proibições contra assassinato, idolatria e relações sexuais ilícitas. Portanto, mesmo que um argumento ético sem ambiqüidade pudesse ser feito contra o aborto, a falta de consenso público e a proibição contra se colocar em risco a vida de uma pessoa levantariam problemas haláchicos significativos.

Permanece a questão de como a discussão haláchica de aborto se relaciona com… a questão de se o aborto deveria ser imune de interferência legislativa com base nos direitos de privacidade e liberdade individual. A halachá também pode estar deixando subentendido que a mulher tem o direito de determinar seu próprio destino e o futuro de sua gravidez quando insiste em isentar as mulheres do dever legal de procriação. Enquanto que os homens sã vinculados à mitzvá (mandamento ) de procriação baseada no Gênesis 1:28 (“frutificai e multiplicai”) e Gênesis 9:7 ( bênção/mandamento de procriação a Noé e seus filhos após o dilúvio), os rabinos se empenharam em acrobacias hemenêuticas para fazer com que as mulheres fossem isentas desta obrigação (levamot 65b). Embora o rationale exato para esta isenção seja apenas aludido, fica claro que os Rabinos sentiram necessidade de não exigir que as mulheres fizessem algo que “colocasse suas vidas em xeque”.

Os Rabinos estavam preocupados principalmente com os perigos físicos do parto, mas também estavam conscientes das dimensões emocional e social : de como as vidas das mulheres eram dedicadas e determinadas pelo parto. A determinação dos Rabinos em isentar as mulheres da obrigação de procriar deixou uma abertura haláchica significativa para a prática da contracepção (levamot 12b). Talvez o fato de que a declaração talmúdica em relação à contracepção seja descritiva e não prescritiva ( o que levou a muita controvérsia em julgamentos pós-talmúdicos sobre a contracepção), tenha sido de propósito. A ssim como os Rabinos intencionalmente se abstiveram de adotar leis prescritivas em relação à gravidez e o nascimento, também se abstiveram de oferecer tais julgamentos sobre a concepção e o parto. Assim, podemos apontar em justificativas haláchicas para o argumento de que o estado ou qualquer outra autoridade legal não deve legislar naquelas áreas que exigem que a mulher coloque sua vida em perigo. [3]

IV. Judaismo e Aborto – Considerada a principal entre as religiões monoteístas, o Judaísmo originário das crenças do povo judeu é estruturado em três pilares principais: Ø a Torá; Ø boas ações Ø adoração. Por ser uma religião que supervaloriza a moralidade, grande parte de seus preceitos baseia-se na recomendação de costumes e comportamentos “retos’’, com o dever a pratica da justiça, amor e misericórdia, caminhando humildemente nas sendas divinas”. O D-us apresentado pelo Judaísmo é uma entidade viva, vibrante, transcendente, onipotente e justa. Não é uma religião de conversão; efetivamente respeita a pluralidade religiosa, desde que não venha a ferir os preceitos do judaísmo. A prática da religião está presente no dia a dia do judeu com especial atenção à sua alimentação, que deve ser livre de substâncias consideradas impuras; para tanto, é adotado um cardápio específico, denominado kosher.

O Shabat, ou dia do descanso, também é fielmente seguido do pôr do sol da sexta-feira até o pôr do sol do sábado, celebrado com orações, leituras e liturgias na Sinagoga, o templo judaico. As escrituras sagradas, leis, profecias e tradições judaicas remontam a aproximadamente 3.500 anos de vida espiritual e estão registradas em duas principais leituras: a Torá, também conhecida como Pentateuco, correspondente aos cinco primeiros livros do Antigo Testamento bíblico, e o Talmud, uma coleção de leis que inclui o Mishná, compilação em hebraico das leis orais, e o Gemará, comentários de rabinos sobre essas leis em aramaico.

No Brasil, a religião surgiu no século XIX, com a imigração de aproximadamente 5,5 milhões de judeus, entre 1870 e 1920. Hoje, o judaísmo é praticado por cerca de 15 milhões de pessoas em todo o mundo. “O Judaísmo dá importância ao trabalho médico.” Essa foi a primeira observação feita, durante a entrevista, pelo Rabino Chamai Ende, especialista em leis judaicas da sinagoga Beit Chabad do Brasil. Para ele, as doenças e deficiências são fragilidades colocadas na vida do homem por D-us. Contudo, segundo a visão judaica, o homem pode intervir para sua cura, e ele ressalta que, em uma das leis orais, D-us diz que devemos ouvir os médicos. O Rabino explica que D-us atribuiu ao médico a força de curar, sendo ele o responsável por este dom. O médico tem como obrigação se especializar ao máximo para vencer as doenças e fragilidades humanas, conclui o rabino. Quanto aos métodos da medicina atual, o Rabino salienta que apenas em três situações, ainda que para evitar risco de morte, os princípios judaicos não abrem mão da religião e vetam; são elas: idolatria, homicídio e relações incestuosas.

Com muita convicção no que diz, o Rabino Chamai Ende cita que dentro das leis judaicas tudo deve ser feito para a construção de uma família, desde que esse filho seja fruto de um casamento realizado sob os preceitos da religião judaica, sendo vetada qualquer forma de ajuda para casais que não se enquadrem nela, seja por médicos judeus ou não judeus. Perguntado sobre os métodos de inseminação artificial, o Rabino declara que os três tratamentos são aprovados pelos judeus. Porém, ele cita algumas recomendações específicas de cada procedimento. O coito programado é aceito, desde que seja feito dentro das leis da religião, como foi esclarecido no começo do capítulo. Além do apoio da religião, o casal com dificuldade para engravidar encontra todo o apoio dentro da comunidade judaica para a realização de seu sonho.

No caso da inseminação artificial e da fertilização in vitro, o religioso explica que há algumas recomendações que devem ser respeitadas. A maneira como o sêmen é retirado, para ambos os tratamentos não pode ser da forma costumeira. Ele explica que deverá ocorrer uma relação sexual entre o casal e a coleta do sêmen deve ocorrer utilizando-se uma camisinha especial.

Quanto ao procedimento de congelamento de óvulos e embriões, a prática é aceita desde que com acompanhamento de um rabino, assim como nos outros métodos, e com a garantia de que estes não serão utilizados por outra pessoa.
Mesmo quando o rabino cita a obrigação do casal judeu de ter filhos, faz questão de lembrar que são totalmente contra a doação de embriões. O mesmo vale para doação de sêmen e óvulos.

Dentro dos costumes judaicos, todos os procedimentos de uma inseminação assistida precisa do acompanhamento e da supervisão de um rabino em todas as etapas, desde a coleta do sêmen e óvulos até e, principalmente, o processo da fecundação. Hoje existem rabinos especializados nesta área para auxiliar os casais judeus com esse tipo de tratamento. “Nós consideramos o casamento algo sagrado. Gerar uma criança é um ato físico normal, mas dentro do Judaísmo não pode ser usado em outra pessoa. É como se estivéssemos profanando o embrião que foi feito por esse casal, comparado a uma invasão familiar”, ressalta o Rabino.

Quanto ao aborto, agora, podemos afirmar que o feto é uma criatura à parte e independente da sua mãe?
Ou talvez considerar o feto, antes do seu nascimento, como uma espécie de órgão adicional da mãe. O Talmude ensina que se lhe proporciona uma alma ao embrião no momento da concepção. É claro que, segundo o Talmude, o feto possui individualidade e, por isso, é um ser aparte da mãe, e não pode ser considerado como um outro órgão da mesma forma.

O Talmude refere-se ao embrião durante os primeiros quarenta dias de gestação como mayá beamá, que quer dizer “simplesmente água’. Podemos deduzir que até este momento não se considera o embrião como um ser humano em todo o sentido. Mas tão pouco se implica que deixemos de apreciar que estamos frente a uma vida humana em potência. O fator determinante é sem dúvida a saúde e o bem estar da mãe. Nos casos em que o feto tem deficiências genéticas, a nossa tradição desaconselha o aborto porque não existe a certeza da falha que se acha que não pode ser corrigida no futuro. E que diferença terá para nós o conceito de vida de um ser que tem deficiências com um que não tem? Teremos sempre em conta os efeitos negativos que um bebê nestas circunstâncias pode trazer para a mãe, se a mãe afirma e decide que não quer dar à luz um filho com sérias deficiências mentais ou físicas e isso será motivo para o seu desespero, aqui se pode pensar na possibilidade de fazer um aborto, pois a nossa responsabilidade primária tem a ver com a saúde e o bem estar do ser humano integro, que neste caso é a mãe.” “Reflexões Sobre o Aborto” (1991), Luz – Textos e Depoimentos (Âncora, 2001), uma recolha de escritos de Abraão Assor, rabino da comunidade judaica de Lisboa de 1941 a 1993. Em termos gerais, tal como escreveu o saudoso rabino Abraão Assor neste texto que transcrevemos, a Halacháh (Lei Judaica) não só permite o aborto, como em algumas circunstâncias exige a interrupção da gravidez. Acima de tudo, norteada pelo princípio da responsabilização individual – um princípio central do judaísmo –, a tradição judaica coloca a decisão na esfera familiar e, por vezes, comunitária.

Historicamente, nos países onde a interrupção voluntária da gravidez se tem assumido como tema político de clivagem – especialmente nos EUA –, as comunidades judaicas têm manifestado uma oposição unânime à restrição do aborto por via legislativa. Os três principais ramos do judaísmo moderno (ortodoxo, conservador e reformado) defendem que a discussão do aborto pertence apenas e exclusivamente às mulheres e famílias afetada, e não deve ser motivo de regulamentação legislativa ou demagogia política.

Mesmo assim, nos últimos anos, surgiram algumas correntes antiaborto no seio de movimentos judaicos ultraortodoxos, influenciados em grande medida pela forma como o tema tem elevado a importância política de movimentos idênticos na direita cristã. A pressão de alguns partidos religiosos ultraortodoxos em Israel, por exemplo, fez com que as dificuldades econômicas deixassem de constar da lista de razões legalmente reconhecidas para que uma mulher pudesse recorrer ao sistema nacional de saúde para abortar. Ainda assim, em Israel a interrupção voluntária da gravidez continua a ser legal – gratuita ou com custos moderados –, com algumas restrições consideradas “meramente formais” (ver Abortion in Israel: Terms of Termination).

Pela legislação judaica, o feto não é considerado uma pessoa, antes do nascimento. Ele é considerado parte do organismo materno até o momento em que emerge do útero. Nos primeiros quarenta dias de gravidez, o ovo fertilizado é considerado apenas um fluido sem forma. No Livro Êxodo (Shemot), se há uma briga entre homens e um deles agride uma mulher grávida e esta aborta, o agressor paga apenas ao marido uma quantia para resgatar o bem perdido, mas, se a mãe também morre, ele paga o crime com á vida (Êxodo, 21: 22 – 23) . Disso deduzem os sábios que o feto não é um ser humano, porque a morte de um ser humano é punida na bíblia com a morte do assassino , pois está escrito que ‘’ quem agride um ser humano e o mata , deve morrer (Ex 21:12) . O feticídio não é , portanto, punido com pena capital, mas isso não exclui ser crime praticá-lo.

Em fontes talmúdicas (Mishnáh – Tratado Ohalot) a vida da mãe tem precedência sobre a do feto. Assim quando o trabalho do parto ameaça a vida materna, é permitido destruir o feto (embriotomia ) para salvar a mãe. O direito à vida do feto é subordinado ao da mãe e o feto pode ser sacrificado para salvar a vida da mãe. Maimônides vai além. Ele acha que o feto que ameaça à vida da genitora é um agressor engajado em ameaça, da vida materna, e assim deve ser eliminado. Alguns acham que essa definição faz com que o aborto só possa ser sancionado quando o feto é ameaça à vida quem o concebeu e que, nos outros casos o aborto seria um crime de assassinato.

Ainda a Mishnáh (Tratado Arachin) diz: “se uma mulher grávida é condenada à morte e deve ser executada, não devemos esperar o nascimento da criança; mas se as dores do parto já começaram, devemos esperar até que o parto se realize”. A Mishnáh, neste tratado, explica que o embrião é parte do corpo materno, não tem identidade própria porque depende do organismo materno para viver. Contudo, logo que ele emerge do útero e começa a respirar, é considerado um ser autônomo (nefesh), e assim não afetado pelo estado da mãe. Esse conceito do embrião considerado como parte do organismo materno é endossado pelos talmudistas e pelos rabinos da idade média. Uma toseftá (suplemento ou anexo do Talmud, [escritos por uns 150 sábios, estes eruditos viveram entre os séculos XII e XIV em França e Alemanha principalmente] no tratado Nidáh) constata que é permissível matar um feto não nascido. Mas algumas autoridades acham que essa interpretação não deve ser tomada ao pé da letra e outras autoridades mesmo que essas palavras dos Tosafot são erradas. Indiscutivelmente, nos primeiros quarenta dias de gravidez, ovo fertilizado é considerado como mero fluido sem forma e após esse prazo a formação do feto começa ocorrer. As leis de impureza devem ser observadas pela mulher que aborta após os quarenta dias, e essas leis não são idênticas às que se seguem a uma menstruação, mas sim às que se seguem a um parto.

Pela lei judaica, a permissão de comer terumá (ofertas a D-us) é um privilégio de filhas solteiras, não casadas, de um sacerdote. Esse privilégio é compartilhado por filhas casadas sem filhos e também por aquelas grávidas com menos de quarenta dias de gravidez. Algumas autoridades acham que essa regra é suficiente para mostrar que o feto antes dos quarenta dias não é um ser com qualquer direito. Após os quarenta dias, o feto adquiriria um caráter de personalidade e, a não ser que ele ameace a vida materna, ele não poderia ser eliminado. A qualidade de vida que o feto terá após o nascimento não seria uma razão para o aborto. Assim, mesmo que se preveja o nascimento de uma criança com Tay-Sachs, mongolismo ou outra doença, que vai ser uma sobrecarga para os pais e para a criança, pela lei judaica isso não seria razão suficiente para o aborto. Anomalias físicas ou mentais não afetam o direito de viver do individuo.

A autoridade rabínica do século XII, Rabi Iehudáh, o hassid [o pio] , proíbe terminantemente a terminação da vida ou infanticídio de uma criança nascida monstruosa. Estas considerações se estendem, de acordo com muitas autoridades religiosas, ao termino intrafetal da vida. A gravidez não pode ser interrompida mesmo que a mãe durante a gravidez tenha tido rubéola, ingerido talidomida, ou haja indicação pré-natal de nascimento de criança mongoloide ou com Tay-Sachs (rubéola?). Outras autoridades religiosas adotam ponto de vista oposto e permitem aborto, nas primeiras etapas da gravidez, em consideração aos sofrimentos futuros dos pais para criar a criança anormal. Em relação ao estupro, muitas autoridades religiosas são contra o aborto, nesses casos.

Um resumo do ponto de vista judeu em relação ao aborto foi feito pelo professor Abraham S. Abraham: O aborto poder ser induzido se há perigo para a vida materna,quando a gravidez ameaça a saúde física ou mental da grávida.O aborto é permitido porque, em tais circunstancias, o feto (que ainda não é uma pessoa formada) é considerado um agressor que tem como finalidade matar a sua mãe e a vida materna tem precedência sobre a do feto.Mas, uma vez emergida a cabeça do feto, durante o parto, a criança não pode ser mais afetada.

Ela constitui então uma entidade viável,cuja vida é tão importante como a da mãe, e uma vida não pode ser sacrificada em favor de outra. Se o aborto é sancionado pela Halacháh (lei judaica) ele deve ser realizado de preferência nos primeiros quarenta dias de gravidez.

No que se relaciona à possíveis malformações ou doenças como Tay-Sachs, mongolismo ou defeitos congênitos por rubéola, convém consultar uma autoridade rabínica, porque não há ainda critério firmado. Outros acham que não se deve abortar. Um feto anencefálico deve ser abortado. No caso de gravidez múltipla, é possível permitir que alguns fetos sejam sacrificados para que outros possam sobreviver. [4]

Fontes: [1] http://www.legalsaber.com.br/o-aborto-no-judaismo/
[2] Notícias STF, 06 de agosto de 2018: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=385931
[3] CJB, Narra de Tijuca: https://www.cjb.org.br/khokhma/controv/aborto.htm
[4] http://psicologiadareligiaounicap.blogspot.com/2016/08/judaismo-e-o-aborto.html
Coordenador: Saul Stuart Gefter 12 de Shevat de 5780 – 07 de fevereiro de 2020

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